sexta-feira, 15 de junho de 2018

Homo Ludens - o jeito "brincalhão" brasileiro. (Destaques de leitura - Meira Penna)

...levamos a sério aquilo com que nos divertimos e fazemos brincadeira com coisa séria. (Em berço esplêndido - Meira Penna, p. 259).

Alegria
Diplomata e psicólogo social

José Osvaldo de Meira Penna escreveu um ensaio que dá um "retrato do Brasil". Sua obra "Em berço esplêndido" descreve afundo o comportamento típico nosso, fazendo um quadro geral.

Pretendo apenas compartilhar destaques ou trechos da obra do saudoso diplomata e psicólogo social (falecido em julho/2017). Este é o primeiro de uma série de impressões de leituras que fiz, com o objetivo de despertar o interesse de mais pessoas por obras que tive oportunidade de conhecer. Com impressões quero dizer um parecer de quem leu e algo aprendeu, porém sem pretensão de escrever como quem domina o conteúdo. Inclusive devo relatar que tive grandes dificuldades quando comecei a leitura de "Em berço esplêndido", pois é uma obra rica em referências a mitos, autores clássicos e grandes nomes da psicologia, em especial Carl Gustav Jung. Desta forma, quem não possui alguma noção destes assuntos, certamente terá dificuldades de entender muita coisa que Meira Penna quis dizer no livro (como aliás eu tive dificuldades e não posso afirmar que superei tais dificuldades). E com isso não quero desencorajar a leitura da obra, senão alertar das dificuldades para já deixar de sobreaviso àqueles que a quiserem conhecer. 

Recomendo aos que interessarem, fazer o que eu não fiz na época, que é seguir a orientação de Mortimer Adler: ler a primeira vez sem a pretensão de entender tudo. Adler foi autor do clássico "A arte de ler" - no original "How to read a book". Na edição mais recente está com o título "Como ler livros". Nesta obra ele recomenda fazer a leitura de livros de exposição de forma contínua, sem a preocupação de entender cada parágrafo, cada frase e cada palavra. Neste caso, numa primeira leitura, o que é mais importante é pegar a ideia geral. Mesmo que nesta primeira leitura só dê para captar metade da mensagem, não é tempo perdido. Por outro lado, Adler chama a atenção para a importância da humildade que devemos ter diante de uma obra complexa, no sentido de termos a consciência de não termos o nível de conhecimento do autor, não podendo desta forma acompanhar todo o seu raciocínio num primeiro contato. Seria semelhante ao caso de um aluno querer logo na primeira aula, entender tudo que seu professor entende, quando mal consegue entender o conteúdo daquela primeira aula. Confesso que não segui tal orientação na época que fiz a primeira leitura de "Em berço esplêndido; pelo contrário: fiz logo na primeira o que Adler recomenda fazer numa segunda leitura (na época eu não conhecia a obra de Adler). Numa segunda leitura ele recomenda sim, pegar o livro para entender em detalhes.

Alonguei bastante de propósito, saindo um pouco do tema, pois é uma precaução valiosa...

Jeitinho "bacana" brasileiro

Os brasileiros somos conhecidos pelos adjetivos 'acolhedores', 'alegres', 'festivos'. 

Meira Penna faz algumas considerações sobre a falta de seriedade no capítulo Homo ludens (homem lúdico). A frase em destaque no início do texto aqui é um resumo. Assuntos como política, economia, educação e outros não prendem tanto a atenção como o carnaval ou o futebol.
O brasileiro leva a sério o carnaval, o futebol, a loteria esportiva, as badernas de estudantes, as eleições. (...) Fale-se de economia, de educação, técnica, política externa, serviços públicos, agricultura, finanças, transportes, comunicações, comércio, indústria, filosofia, religião e ciência política - não se consegue prender a atenção na seriedade da atitude e do comportamento. (p. 259)
Falando por experiência, na prática já vi psicólogo que tem preguiça de pensar, padre pouco disposto a rezar, professor mais inclinado a falar que ensinar... E naturalmente isso está presente neste que aqui escreve, quando tendo a fazer pouco do que é de dever do ofício e muito me aplico em questões de lazer. Tendo eu a presar muito o tempo livre em detrimento do tempo de expediente.

Outra coisa que notei, a partir do que o autor descreve no capítulo, é nosso patriotismo (se é que pode chamar assim), pois ver bandeiras do Brasil em janelas, carros e ruas é algo que ocorre durante os jogos de copa do mundo. Patriotismo autêntico só é visto entre membros das forças armadas. Já entre os civis, o comum é uma espécie de patriotismo "desportivo" - algo como um orgulho de ser brasileiro enquanto campeão no jogo, seja futebol, corrida, vôlei, basquete. Principalmente no futebol, onde já muitos expressaram com orgulho o fato de sermos "campeões do mundo", ostentando uma conquista de uma modalidade esportiva como se fosse a conquista de toda uma nação. Neste caso, como Meira Penna notou, o jogo está sendo levado muito a sério. 

O jeitinho brasileiro, "bacana" com sua ginga futebolística, além de carnavalesca (assunto que é tratado em outro capítulo do livro), é levado muito a sério por muitos de nós. Exemplo antigo é o da derrota da seleção em 82 para a Itália. 3 pessoas em Fortaleza morreram, vítimas de colapso cardíaco logo depois da eliminação (dado registrado no livro "Guia politicamente incorreto do futebol" - Jones Rossi e Leonardo Mendes Júnior). Eu soube que a vitória de 1994 também abalou perigosamente muitos corações, o tetla que Galvão tanto gritou, representando as fortes emoções de boa parte do público.

Meira Penna neste capítulo de seu livro dá um belo "puxão de orelha" no nosso jeito "bacana" com muito de sacana de ser:
O homem maduro e desenvolvido é aquele que sabe brincar, mas sem prejuízo da seriedade que se impõe perante o trabalho e a sociedade (p. 269)
José Osvaldo de Meira Penna


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